como escrever boas notas
Reflexões sobre o medo de perder memórias e como a gestão do conhecimento, com métodos como o Zettelkasten, me ajuda a manter a mente organizada e ativa.
Estava conversando com uma amiga sobre os nossos maiores medos e concordamos rapidamente que perder alguém quem amamos é o maior de todos eles. Não acabou aí, também falamos sobre fobias, como o medo de estacionamentos vazios, de ficar preso na porta giratória do banco (haha!) ou até o medo de altura ou entrar no mar, por exemplo.
No meio dessa conversa, acabei compartilhando o meu mais temido pesadelo: não conseguir absorver novos conhecimentos, organizar ideias e conectar informações, chegando ao ponto de esquecer tudo!
Fiquei pensando sobre isso depois, sozinha, e percebi que, entre todas as doenças e lesões, aquelas que afetam a memória são as que mais me assombram. Doenças como Alzheimer ou amnésia pós-traumática, sabe?
Tenho medo de perder minhas memórias mais queridas, especialmente as de infância e da minha filha, embora saiba que essa é uma preocupação que todos compartilham. O que mais me assusta, no entanto, é a possibilidade de perder algo fundamental para a convivência consigo e com os outros, como a consciência, a linguagem e tudo o que aprendi ao longo da vida.
A ideia de desmemoriar o que dei duro para aprender e guardar é angustiante. Esse medo não está restrito a um cenário extremo de perda total de memória, mas também a aqueles momentos em que adquirimos tanta informação sem realmente compreendê-la, a deixando escapar sem aplicar ou usar para nada.
Todos os dias, passamos horas consumindo conteúdo — lendo, ouvindo, assistindo — e, todos os dias, me pergunto para onde tudo isso está nos levando. Alô, sobrecarga de informações!
Tenho me esforçado para ser mais intencional e organizada no modo como aprendo coisas novas, e por isso, tenho estudado e adotado algumas estratégias de organização e registro de conhecimento.
Há muitos métodos úteis, como tomar notas, criar resumos sobre o que foi estudado ou usar aplicativos de gerenciamento de informações para consolidar tudo, tornando as informações acessíveis quando necessário. Já compartilhei algumas dessas técnicas e ferramentas, como o método GTD, por exemplo.
Recentemente, li o livro Como escrever boas notas [How to Take Smart Notes], de Sönke Ahrens, e foi nele que conheci o Zettelkasten, uma ferramenta sistemática de anotações e gestão de conhecimento, criada por Niklas Luhmann. O método destaca o envolvimento ativo com os nossos registros e a conexão entre as ideias. Tipo grafos de conhecimento. O nome pode parecer estranho, mas Zettelkasten é basicamente o conceito de uma "caixa de cartões" ou um "arquivo de fichas".
Como funciona?
Esse método organiza as notas individuais (chamadas de Zettel — do alemão) contendo informações específicas em caixas. À medida que você pesquisa, novas notas são adicionadas, enquanto as anteriores são revistas e conectadas por meio de um sistema de numeração para facilitar o processo de organização e ser mais fácil de encontrar o que precisa mais tarde. Você pode atribuir cada caixa a um assunto específico, como "países", "documentos" ou "viagens". Assim, fica mais fácil localizar a informação.
Embora, no passado, Luhmann tenha usado caixas físicas, não há necessidade de seguir esse modelo. O método pode ser adaptado para formatos digitais. Existem vários aplicativos, como Notion, Obsidian, Roam Research, entre outros, que desempenham a função de anotar e organizar informações. Pretendo falar mais sobre esses aplicativos em outro post.
O sistema de numeração é hierárquico. A primeira nota pode ser numerada como '1', e, se a próxima for uma extensão da primeira, recebe a variação '1a'. Se for sobre outro tema, recebe o número '2'. Por exemplo, se você tem uma nota sobre literatura e outra sobre livros de não-ficção, você escolhe números diferentes, mas pode usar a mesma estrutura de numeração para conectá-las.
Existem três tipos de notas no Zettelkasten: as ideias rápidas, que você escreve onde for, as notas bibliográficas, que registram informações sobre as fontes, e as notas permanentes, que são as principais notas do sistema.
A combinação desses tipos de notas cria um sistema de gestão de conhecimento que ajuda a organizar os pensamentos e ideias de forma estruturada.
Não sei se me fiz entender. Haha!
*Quero ENFATIZAR que demorei bastante para entender o conceito de Gestão de Conhecimento Pessoal (PKM) e toda sua complexidade.
Além do Zettelkasten, o livro traz uma história interessante sobre a psicóloga Bluma Zeigarnik. Um dia, durante um almoço em um restaurante, ela observava a habilidade do garçom de memorizar os pedidos dos clientes sem anotar nada. Chocada, ela ficou pensando em como ele fazia isso. A refeição seguiu seu curso e, no fim, ela saiu, como todos, sem dizer uma palavra. Só que, ao voltar para pegar a jaqueta que deixara para trás, o garçom não a reconheceu! O impulso de questioná-lo tomou conta e a resposta dele foi que os garçons tendem a esquecer os clientes assim que saem do restaurante, para dar espaço [mental] ao próximo grupo de pessoas.
Sönke Ahrens, o autor do livro, fala sobre o tal efeito, onde as tarefas que não estão completas acabam tomando conta da nossa memória de curto prazo, como se estivessem sempre ali, pedindo para serem finalizadas. Às vezes, aquelas pequenas pendências ficam martelando na cabeça até que, finalmente, a gente risca da lista.
O livro também explora como a escrita pode ser uma aliada para organizar as ideias. Ele traz uns princípios bem legais para tornar as notas mais eficazes e até estratégias de como sistematizar e revisar tudo isso de um jeito que faça sentido. Não é só sobre escrever, é sobre transformar as ideias em algo concreto, que você pode revisitar sempre que precisar.
“Se você quiser aprender algo a longo prazo, terá que escrever. Se quiser entender algo, terá que traduzi-lo com suas próprias palavras.”
– Sönke Ahrens
Rodapé
O uso de notas ou cartões de papel remonta à invenção do sistema de catálogo de fichas por Conrad Gessner, um estudioso do século XVI. Esse sistema permitiu a fácil reorganização dos cartões de papel e tornou-se uma nova forma de gerenciamento de informações acadêmicas, substituindo o antigo sistema de notas.
Na década de 1980, o conceito de Zettelkasten ganhou popularidade como uma metáfora para projetar interfaces hipertextuais de base de conhecimento pessoal. NoteCards, um aplicativo que utilizava fichas ou notas interconectadas, foi um dos primeiros a adotar esse conceito e inspirou o desenvolvimento de wikis na década de 1990.
Fonte:
https://zettelkasten.de/